Exercício físico ajuda a combater AVC, diabetes e insuficiência cardíaca

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E se fazer uma atividade desportiva fosse tão eficaz quanto tomar fármacos? A sugestão foi avançada por um estudo e, nos últimos anos, tem vindo a ser defendida por muitos especialistas

Fazer exercício é, potencialmente, tão eficaz quanto a ação de certos medicamentos na redução da mortalidade associada a alguns problemas de saúde. A conclusão é de um estudo publicado em outubro de 2013 no BMJ, site subsidiário da British Medical Association, que comparou o impacto de ambas as estratégias no tratamento da insuficiência cardíaca e na reabilitação após um acidente vascular cerebral (AVC).

Foi também feito um estudo comparativo desse impacto na prevenção da diabetes e na prevenção do agravamento da doença coronária (prevenção secundária). Esta foi a primeira revisão meta-epidemiológica a comparar os benefícios do exercício físico e dos medicamentos na redução da mortalidade associada a algumas doenças.

As conclusões, que têm sido corroboradas por outros investigadores, são entusiasmantes, pelo menos para muitos dos especialistas que habitualmente lidam com o problema. «As intervenções baseadas no exercício físico deveriam ser consideradas uma alternativa viável ou a par da terapia medicamentosa», indicam os investigadores.

O que foi descoberto

Em termos globais, não se registaram diferenças estatísticas entre os benefícios do exercício e os dos medicamentos para nenhuma das doenças estudadas, exceto no caso da reabilitação de AVC, em que as «intervenções com exercício físico estavam associadas a uma redução da mortalidade, mais do que os medicamentos», salientam os investigadores. Na análise doença a doença, os fármacos (diuréticos) revelaram-se mais eficazes do que o exercício a tratar a insuficiência cardíaca.

Na prevenção secundária da doença coronária e na prevenção da diabetes, não foram detetadas diferenças estatísticas, isto é, «pessoas que fizeram exercício tinham o mesmo risco relativo de morrer da doença que aqueles que tomavam os medicamentos mais prescritos», explica Duarte Galvão, docente de fisiologia do exercício.

Segundo este especialista, estes resultados «sugerem que o exercício pode ser bastante potente no tratamento de doenças do coração e outras, igualando os benefícios da maioria dos medicamentos comummente prescritos».

Como foi feito o estudo?

Foram revistas meta-análises (uma técnica estatística que integra os resultados de dois ou mais estudos sobre a mesma questão) de estudos sobre doenças para as quais havia resultados de ensaios clínicos randomizados (baseados na comparação entre duas ou mais intervenções) relativos ao impacto da medicação e do exercício. As quatro doenças selecionadas foram as únicas para as quais foram encontradas análises sobre o impacto do exercício físico na mortalidade dos pacientes.

«Estudos comparativos de eficácia», comenta Duarte Galvão, fisiologista do exercício, «são um garante da ciência, especialmente na pesquisa farmacêutica, mas poucos estudos compararam diretamente o efeito de fármacos com o do exercício, e menos ainda em termos de mortalidade», considera.

«Neste estudo, os dados cobriram 305 experiências que, coletivamente, envolveram quase 340.000 participantes, um total impressionante. Mas a maioria tinha recebido fármacos. Apenas 57 experiências, envolvendo 14.716 voluntários, tinham examinado o impacto do exercício», acrescenta ainda o especialista.

As limitações da investigação

Na altura da publicação, os autores do estudo salvaguardaram , contudo, que «os resultados devem ser interpretados com cautela, tendo em conta a escassez de dados e os diferentes cenários envolvidos». E explicaram que as evidências sobre intervenções baseadas no exercício físico são limitadas na quantidade. Dos 305 ensaios considerados, apenas 57 avaliaram o impacto do exercício físico, que assim envolveu apenas 4.716 em 339.274 participantes.

Além disso, «os resultados não são generalizáveis a diferentes tipos de atividade física, uma vez que o tipo de intervenções de exercício varia nos diferentes ensaios considerados». Neste sentido, sublinham a importância de, nos ensaios clínicos, serem descritos aspetos como, por exemplo, se as atividades físicas são individuais ou de grupo e qual o grau de supervisão das mesmas, para que os fatores que explicam a sua ação benéfica possam ser identificados e o exemplo ser seguido por outros doentes.

O que deveria mudar

«As abordagens com exercício deveriam ser consideradas uma alternativa viável ou a par da terapia medicamentosa», advogam os investigadores à luz dos resultados. Consideram também que os médicos de família «deveriam aconselhar amaioria dos pacientes sobre os benefícios do exercício e referenciar os que têm doenças crónicas para programas de reabilitação que o incluam».

Mas apontam a falta de evidências sobre «que pacientes beneficiariam mais de que tipo de exercício e quais podem ser ou não eficazes em diferentes cenários». Também a informação sobre eventuais efeitos secundários é limitada, mas referem dados encorajadores, como um estudo que acompanhou, durante dez anos, a reabilitação, com base em exercício físico, de pacientes com falência cardíaca, não tendo detetado efeitos negativos que justificassem a interrupção dos treinos.

Em suma, «não se está a sugerir que as pessoas parem de tomar os seus medicamentos, mas talvez que pensem no seu estilo de vida e falem com o seu médico sobre se o exercício pode e deve ser incorporado na sua rotina», remata Duarte Galvão.

O presente e o futuro

«Este estudo», sublinha o docente de fisiologia do exercício, «levanta questões importantes sobre se o nosso sistema de saúde se centra demasiado em medicamentos e pouco na atividade física para combater doenças físicas». «Como anteriormente recomendado, os médicos devem dar conselhos sobre os benefícios do exercício físico, referindo-se a um programa de reabilitação não somente farmacológico, mas que inclua exercício», refere ainda.

«A prescrição varia em termos de tipo, intensidade e duração, destacando-se a necessidade de se adaptar às circunstâncias individuais de cada paciente, como a severidade da doença de base e a mobilidade», acrescenta.Sendo este o primeiro estudo comparativo deste género, os investigadores responsáveis pelo estudo apontam a necessidade de mais ensaios randomizados sobre a eficácia comparada das duas abordagens. Para a colmatar, dão uma sugestão.

«Os reguladores podiam requerer às farmacêuticas que patrocinam novos medicamentos que incluam intervenções baseadas em exercício como comparador nos ensaios. Em casos em que os medicamentos forneçam apenas um modesto benefício, os pacientes merecem compreender o impacto relativo que a atividade física pode ter na sua condição», sugerem.

As conclusões do estudo:

- Diabetes

Em termos estatísticos, a práticade exercício é tão eficaz na prevenção quanto a toma de medicação.

- Doença coronária

Em termos estatísticos, a prática de exercício é tão eficaz quanto a toma de medicação a impedir o seu agravamento.

- AVC

O exercício revelou-se mais eficaz na reabilitação do que a toma de medicação.

- Insuficiência cardíaca

Os diuréticos revelaram-se mais eficazes no seu tratamento do que o exercício físico. No global, o  exercício e os medicamentos não diferiram em termos de benefícios para nenhuma doença, exceto a reabilitação do AVC, em que o exercício se revelou mais associado à redução da mortalidade do que os fármacos.

Por: Rita Miguel com Duarte Galvão (fisioterapeuta e docente de fisiologia do exercício)

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